Lugares da infância são sempre carregados de fortes reminiscências. Embora normalmente permaneçam quase cristalizados na lembrança, fixos como imagem, nos parecem sempre animados por conta das infindáveis recordações que evocam. Quando vemos uma foto, todo um mundo de sensações e memórias vem junto, mas se o retrato for uma pintura, um desenho, uma imagem recriada, mais ainda a imaginação e a interpretação se revelam. E o que temos, então, é o traçado de um espaço onírico, um esboço anímico que, mais do que a representação fidedigna em termos de forma, nos oferece um pouco do visível e muito do invisível.
Nesse óleo de 1991, quis representar um lugar que amava e que fez parte da minha vida até o começo da idade adulta. Ele não existe mais, mas para mim permanece incrivelmente presente quando me reporto a ele. Creio que foi minha avó paterna, que tinha um humor meio zombeteiro, quem o apelidou de “Canudo”, pois o ambiente interno da casa era todo constituído por salas contíguas, uma dando para a outra sem espaços conjugados na mesma peça, alongado e pouco iluminado, a exemplo de um tubo. Ele ficava nos fundos do hotel do meu avô — o Hotel Sperb, em Tramandaí — e vivíamos por ali, correndo, brincando, por vezes almoçando embaixo das árvores, interagindo à beça nesse universo familiar por excelência. Por isso, decidi recriá-lo na pintura, tentando dissolver um pouco a dor de tê-lo perdido.
A cachorrinha que se vê deitada na porta, com a cabecinha no degrau, é a Xuxa, que foi um dos nossos bichinhos mais amados lá da praia e que permanecia ali, nessa pose, quando estávamos por perto. As árvores, um pé de Jasmim Manga eternamente florido, cujo perfume deixava ainda mais aconchegante aquele espaço, e um abacateiro que dava os melhores frutos, de uma consistência e um sabor que jamais reencontrei. E a sombra que se projetava no chão era o que deixava tudo com aquele aspecto de sonho, convidativo, ameno, encantador. A janela grande era do quarto da vó e do vô — que depois foi do meu pai e de minha mãe —, a janelinha era do banheiro e em seguida vê-se a porta da cozinha, onde a Xuxa gostava de ficar e que era o acesso mais utilizado. O resto da construção está escondido pelo abacateiro.
Ofereci essa pintura para minha mãe, como forma de também diminuir a dor de suas perdas e trazer de volta um tanto da vida e das muitas histórias bonitas que estão relacionadas com esse ambiente.
Lindo demais. Quantos detalhes nessa obra. E a sombra? Perfeita. Tenho muito dessas coisas tb, de lembrar da infância. De momentos únicos que ficam pra sempre com a gente. Lembrei da Pintada, a cadelinha que tinha no sítio do meu tio. Brinquei muito com ela. Tinha uns 10/12 anos. Ia todo sábado pra lá por um bom tempo. Obrigado, Dudu!
que linda memória, Aluisio querido! obrigado por compartilhá-la e pela tua apreciação. abraço grande! ❤️✨
Dudu me autorizou e compartilharei uma lembrança de infância, também… sobre uma das raras vezes (umas 5, no total) que fui com a mãe para a cidade dela, em Corrientes, Argentina.
Ficávamos na casa “de la abuelita” (avozinha) e era um mundo maravilhoso pra mim, que morava em apartamento…
Tudo chamava a atenção, claro.
Numa das vezes, qdo tinha 8/9 anos, na hora “de la siesta”, eu aproveitava para fazer incursões por tudo!
Imagina que tinha galinheiro!
Eu entrava na “casinha” das galinhas, examinava pra ver se tinha algum ovo, dava milho, mexia com os pintinhos…
Numa dessas vezes, a meliante aqui foi pega, com a boca na botija!!!
Tô lá bem feliz, dando milho pra galera… me viro e tchan tchan tchantchaaaam!!!
Estava la abuelita de braços cruzados me olhando, com aquela cara de… vó!!!
Caraca, fiquei imóvel, achando que eu tinha cometido um crime inafiançável e seria punida com os rigores da lei.
Mas não, ela só me disse para não fazer mais aquela “arte”… mas não gostei da cara feia que ela me fez!!!
Kundryka querida, que lindo esse relato! ✨🌸✨
Q relato delicioso
Quadro lindo Dudu….poucas vezes vi um abacateiro tão bem pintado quanto esse.
….E tudo o mais….uma beleza só.
Que dimensão tem, se lembra?
A dimensão do quadro, é claro, porque a da memória sei que é
imeeeeensa..
… e nos leva junto, com a lembrança da nossa infancia, de nossos avós e daquela árvore que nos acompanhou por um bom tempo 🌳
eh, Miroquinha que lindo, obrigado! ✨❤️✨ olha, as dimensões não lembro, não. devia ter conferido e anotado aqui, né… mas ele deve ter em torno de uns 60cm X 40cm. e foi pintado sobre madeira.
Eu amei teu relato, Dudu, e o quadro, é um sonho, de tão lindo, a gente se imagina ali direto, uma viagem!!!
ahahah, amada! gracias. ❤️
Dudu, que demais esse relato e o quadro, então!! Dá para re-sentir a atmosfera das memórias da infância… a luz, a sombra das árvores, aquela quietude e beleza das casas daquela época. Maravilhada pela imagem-memória. Belíssimo quadro 🧡
gracias, Francine querida. coisa boa que “entraste” assim no quadro, na história. 🌸✨🌸